Morgan Delt
Psychedelic/Lo-Fi/Indie
http://morgandelt.bandcamp.com/
Por: Cleber Facchi
A música de Morgan Delt é uma viagem. Nome curioso da sempre mutável cena californiana, o cantor e compositor norte-americano parecer ter encontrado um caminho particular para brincar com as experiências lisérgicas que há décadas orientam a música psicodélica. Sem se importar com a formação de prováveis hits e arriscando a sufocar o ouvinte, tamanha a quantidade de efeitos e distorções que escapam de sua música, o artista abre as portas coloridas e sujas do primeiro disco solo. Uma viagem de pouquíssimos minutos, mas que promete reverberar por boas horas no ouvido do espectador.
Com um nome inspirado no personagem principal do filme de 1966, Morgan – A Suitable Case for Treatment, Delt não esconde a explícita relação com as referências exaltadas ao longo de toda a década de 1960. São camadas de emanações chapadas e vozes essencialmente sujas que se perdem em meio aos arranjos quase caseiros do álbum. Um exercício que amarra (de forma involuntária) as pontas soltas entre os Beatles pós-Rubber Soul e o trabalho esquizofrênico lançado por Captain Beefheart.
Extrapolando os rumos de qualquer artista conterrâneo, caso de Ty Segall e Thee Oh Sees, e indo além das invenções coloridas de gigantes como Tame Impala, Delt parece afundar lentamente em um imenso lago de ácido e ilusões. É difícil saber exatamente onde começa e termina o disco, afinal, cada passo dado pelo cantor no decorrer da obra parece distanciar o espectador daquilo que foi apresentado nos momentos iniciais do disco. Ruídos, vozes sobrepostas, acordes e melodias submersas, tudo funciona de forma aleatória, como se um sonho fosse lentamente remontado.
Com todas as pistas entregues na faixa de abertura, Make My Grey Brain Green, Delt busca de todas as formas finalizar o disco em um mesmo ambiente temático, porém, é ao escapar dos próprios domínios que o músico realmente acerta. Enquanto músicas como Barbarian Kings fazem com que os arranjos fluam livremente, sustentado pequenas plataformas vocais no meio das distorções, outras como Tropicana se esquivam de qualquer ordem ou mínimo controle. São guitarras e harmonias picotadas, vozes excêntricas e transições desordenadas. Uma completa falta de segurança que permite ao ouvinte passear sem qualquer barreira ou bloqueio.
Em meio ao colorido universo do californiano, pequenos agregados instrumentais parecem formar blocos menos instáveis de sons. Composição mais sutil e ainda assim lisérgica do disco, Obstacle Eyes é uma prova da capacidade de Delt em manusear condensados simples com segurança. Pouco mais de três minutos em que a esquisitice do compositor se revela de forma sedutora, como uma rápida passagem pela música pop. O mesmo reforço acompanha a enérgica Mr. Carbon Copy, faixa que usa do manuseio preciso das guitarras como um instrumento de despertar para o disco.
Fuga assumida da realidade, cada canção do álbum se projeta como um delírio convertido em música. Longe de posicionar o disco como um objeto de transformação para o gênero, o cantor parece apenas interessado em se divertir. São músicas pontuadas por um senso de descompromisso, matéria-prima para o catálogo de ruídos harmonicamente encaixados e vozes que, mesmo inaudíveis em determinados momentos da obra, cumprem com a função de transportar o ouvinte para um novo universo. A música de Morgan Delt é uma viagem, e das melhores que podem existir.
Morgan Delt (2014, Trouble In Mind)
Nota: 7.8
Para quem gosta de: Tame Impala, Foxygen e The Beatles
Ouça: Mr. Carbon Copy, Sad Sad Trip e Obstacle Eyes